Por
Geraldo Lima
Alguém já imaginou encontrar um
vendedor de mapas num semáforo? Pois foi a cena que presenciei, dia desses, ao
parar num dos semáforos da Esplanada dos Ministérios. Cena no mínimo curiosa, para não dizer
anacrônica.
Assim que o sinal fechou, o rapaz
desceu da calçada e veio até os carros oferecer o seu produto aos motoristas.
Sustinha nos braços rolos de mapas que, de onde eu estava, não era possível
saber de que tratavam. Provavelmente havia mapa do Brasil e mapa-múndi. Mapas
históricos e mapas geográficos. Mapas que mostram a divisão dos continentes, do
território dos países, dos estados, das regiões, dos municípios. Como não sou
professor de História nem de Geografia, pode até ser que esteja falando
besteira, mas, para mim, a precariedade daquela atividade econômica era
visível: quem iria comprar mapas, dos quais não era possível saber detalhes,
enquanto esperava o sinal abrir? Desde a dissolução das Repúblicas Socialistas
no Leste Europeu que a configuração do mapa-múndi não para de sofrer
alterações. Como saber, então, que aqueles mapas, nos braços do jovem vendedor,
estavam atualizados?
Aquela era, no mínimo, mais uma
profissão ou atividade econômica fadada ao desaparecimento. Desde a Revolução
Industrial que atividades econômicas, aparentemente estáveis, insubstituíveis,
vêm sendo engolidas pelo surgimento incessante de novas tecnologias ou novos
meios de ganhar dinheiro. Só o rapaz sob o sol das onze horas parecia não saber
disso. A minha vontade era descer do carro e alertá-lo sobre a precariedade do
seu negócio, mostrando-lhe que ele estava deslocado no espaço e no tempo. Que
aquilo se assemelhava a ouvir a campainha da porta tocar e, ao atendê-la,
deparar-se com um vendedor de enciclopédias. Quem, na era da internet,
compraria ainda enciclopédias para expô-las na estante, como era costume até
alguns anos atrás? Eu mesmo, quando adolescente, atendi ao chamado de um
vendedor de enciclopédias e, sem a autorização do meu pai, comprei uma bela coleção
que mofou por anos e anos na estante. Hoje sabemos que a Enciclopédia
Britânica, para escapar da extinção, aderiu aos novos tempos e migrou do papel
para as mídias eletrônicas. Todos migraram para novos suportes e novas
atividades econômicas, menos aquele rapaz ali, no semáforo, tentando vender
mapas a apressados motoristas.
Dava pena vê-lo esbarrar com o
desinteresse dos fregueses. Vi, pelo retrovisor interno, assim que o sinal
abriu, os ocupantes do carro logo atrás do meu rindo a valer. Vi ainda o rapazinho
subi para a calçada com a mesma quantidade de mapas de antes. Depois, tragado
pelo tsunami de carros, não pude ver mais sua figura magra e desoladora sob o
sol escaldante do Planalto Central.
Que boa crônica Geraldo!
ResponderExcluir(fiquei com pena do rapaz).
bjs