Por
Geraldo Lima
O bom texto teatral, como qualquer
obra de arte, é aquele que nos faz penetrar num mundo vasto, do qual só podemos
emergir outro. Uma obra assim nos permite perceber as relações humanas nos seus
mais diversos matizes, dos conflitos amorosos ao embate político ou ideológico,
da amizade mais sincera à traição que sempre aniquila. Vemos o ser humano,
nesse caso, em sua plenitude: capaz de mesquinharias e de gestos heroicos.
Tomando emprestado o discurso de Nietzsche, humano, demasiado humano, é assim
que o vemos. A sua alma vaza pelos poros. Ali, no palco, na figura dos atores e
das atrizes, a vida se descortina assustadoramente bela e trágica diante de
nós. É para fora do nosso eixo de comodidade que somos arrastados todo o tempo.
É nossa consciência que é fustigada sem trégua.
Tudo isso pode ser atribuído à peça
que Arthur Miller escreveu após a morte da atriz Marilyn Monroe, com quem foi
casado de 1956 a 1961. 'Depois da queda', escrita em 1964, mostra, de modo
impiedoso e, às vezes, bem- humorado, o cenário político dos Estados Unidos
durante a caça aos comunistas (e aqui o autor dessacraliza também a visão
romântica do intelectual engajado), sua relação com a família e, obviamente,
com o mito Merilyn Monroe. Arthur Miller não fala diretamente da sua vida. É na
figura de Quentin, um advogado bem sucedido, e de Maggie, uma pop star
depressiva, que ele traz à tona o seu passado.
É, claramente, uma obra autobiográfica, mas que vai além do expor os
percalços amorosos e familiares do autor.
Esta nova montagem da peça do
dramaturgo norte-americano, ganhador do Prêmio Pulitzer de 1949, tem direção de
Felipe Vidal e conta com a participação de um elenco afinado: Simone Spoladore,
por exemplo, se sai muito bem no papel de Maggie/Marilyn Monroe. Lucas Gouvêa
(Quentin/Arthur Miller), com memória invejável, leva sua fala ácida e caudalosa
de ponta a ponta sem grandes escorregões. Gostei, particularmente, da atuação
da atriz Thais Tadesco (Holga, Rose): sensível e ágil na passagem de uma
personagem a outra. Repito: o elenco é afinado. E é isso, aliado à qualidade
magistral do texto, que faz com que o espectador se mantenha ligado durante as
três horas de duração do espetáculo. A
peça fez sua estreia nacional aqui em
Brasília no dia 19 de outubro de 2012, no CCBB (escrevo esta resenha no dia 10
de novembro, um dia antes de ela encerrar sua temporada por estas bandas). Daqui,
parte para uma turnê nacional (só não sei se será apresentada apenas em teatros
do CCBB). Fiquem, portanto, bem atentos, pois este é um espetáculo teatral
imperdível.
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