(Fonte: Google)
Por Geraldo Lima
O nome científico do distinto é coptotermes formosanus, e ele
faz parte de um grupo até eclético, incluindo aí as asquerosas baratas e
o predador louva-a-deus. O que assombra é que há mais de duas mil espécies
dessa praga no mundo. No Brasil, só para
se ter uma ideia, há quatro famílias desse devorador de móveis, livros,
árvores, sossego etc., etc., etc. Como esse inseto gosta de regiões quentes,
aqui é o paraíso para ele. Tanto no solo (cupim de solo) quanto na madeira
(cupim de madeira seca), ele prospera aos milhares.
Os cupins são seres surpreendentes:
formam uma sociedade organizadíssima (se brincar, mais do que a nossa),
composta de rei, rainha, ninfas, soldados e operários, todos cumprindo à risca
o seu papel na colônia, sem greves, sem protestos, sem reivindicação alguma.
Pasmem: a rainha é capaz de pôr um ovo a cada vinte e oito segundos, gerando em
torno de três milhões de ovos por ano. E a infeliz pode viver de vinte e cinco
a cinquenta anos. Jesus Cristo, isso é uma eternidade!
Por que estou aqui a falar (como
diriam os portugueses) desse ser tão indesejado? Imaginem um armário de
cerejeira, quase vinte anos de uso, coisa de primeira, sendo corroído
lentamente, metodicamente, silenciosamente, por um exército de cupins surgido
não se sabe bem de onde. Um belo dia (ou um horrendo dia?), o piso aparece
forrado de grânulos fecais. Poético, não? Grânulos fecais... Só soube que se
tratava do cocô do maldito tempos depois, até então pensava que eram apenas
farelos da madeira. O que fazer? Era apenas um buraquinho na madeira, um
orifício de 3 a
4 mm de
diâmetro, então pensei na minha suprema arrogância: vai ser fácil acabar com
esses danados. Passei logo da teoria à prática: comprei o veneno e inundei o
buraquinho por onde eles se livravam dos tais grânulos fecais e por onde saem
também, fiquei sabendo depois, as
aleluias na primavera (os tais cupins alados que são atraídos pela luz).
Fiquei na expectativa durante umas três
semanas, até concluir, aliviado, que os invasores haviam desaparecido.
Vitória!
Oh, ilusão! Oh, santa
ignorância!
Dias depois, eis o chão forrado de
novo de grânulos fecais. Para meu desespero, outro orifício, ou melhor, outros
orifícios salpicavam a madeira do armário. Atingiam pontos diferentes, como a porta
e a lateral. Do desespero passei à ira.
Parti para a briga indignado. E tome veneno! Eu os exterminava, e eles
ressuscitavam dias depois. Essa luta levou dias, meses, até eu admitir com
humildade que não conseguiria vencê-los totalmente. A ideia, agora, era manter
o jogo empatado, alimentando a sensação de que eu estava conseguindo adiar a
inevitável vitória do inimigo: eu batia o veneno, e eles sumiam... logo depois
reapareciam; eu batia o veneno, e eles sumiam... logo depois reapareciam... e a
vida ia em frente, fora e dentro das galerias escavadas na madeira.
A estratégia estava funcionando.
Havia dias e dias de trégua. Meu ser era só esperança: quem sabe, num lance de
sorte, eu não conseguiria virar o jogo?
Meus caros, lutar contra cupim, sem as armas
adequadas, é uma luta vã. É como lutar contra o câncer.
Dias desses, tendo que fazer uma
reforma no apartamento, fomos obrigados a tirar o armário do lugar. Só então o
câncer apareceu em toda a sua extensão. De ponta a ponta do móvel havia cupim.
E eu pensando que estavam só ali, na superfície, na parte frontal. Atrás, dos
lados, em cima, tudo tomado pelo exército devorador. Até nas revistas e
recortes de jornais (sou um obsessivo guardador de papel) eles haviam
penetrado. Usando sua potente perfuratriz, um deles abriu um furo que
atravessou o bloco de revistas de um lado ao outro. Em outras o estrago foi
maior: figuras inteiras foram devoradas, restando apenas um pedaço de papel em
frangalhos.
O diagnóstico era um só: o armário
estava condenado. Para que a praga não se alastrasse para outros móveis,
tivemos que nos desfazer dele. E foi como se estivéssemos nos desfazendo de uma
parte do nosso ser. Sei que estou parecendo dramático, exagerado, mas foi assim
mesmo, afinal, era uma parte da nossa história que aqueles cupins haviam
destruído.
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