Por Geraldo Lima
DOBRA
1.
Ativa todos os sensores. Como um cão de
caça, apura o olfato. Checa os arredores nos mínimos detalhes. Rastreia a
memória em busca de parâmetros. Mesmo assim, escapa-lhe ainda a realidade que
emergiu, em questão de segundos (ou milionésimos de segundos), diante dos seus
olhos. É como se um mágico cobrisse a paisagem à sua frente com um pano e, ao
retirá-lo, aparecesse outra bem diversa. Isso já estava acontecendo há dias.
Talvez anos. Séculos, quem sabe.
Está andando à deriva?
É ainda um humano?
Precisa de respostas urgentes, porém tem
quase certeza de que não as terá nunca. Há muito tempo, já não consegue falar
com ninguém. O mundo já não é palpável. O corpo perdeu suas bordas. Algo mudou
bruscamente, e ele não se deu conta.
Há poucos instantes, lembra-se bem, estava
lá, naquela casa, entre pessoas cujos traços fisionômicos e timbre de voz já
começam a se dissolver no ácido do esquecimento.
Luta contra essa corrosão, esse desmoronar do passado, esse mergulho no Letes.
Quer reter tudo isso para que funcione, quem sabe, como um fio de Ariadne,
porque acredita, piamente, que um dia ainda irá voltar ao ponto de origem, o
ponto de onde saiu, talvez ( e essa é uma boa hipótese ) para comprar cigarros,
e para onde nunca mais voltou.
(Continua...)
To passando. Tá bacana.
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