quinta-feira, 7 de junho de 2012

Dobras



Por Geraldo Lima

Dobra 4.
        
Sobre sua cabeça, um enxame de naves espaciais indo e vindo. Embaixo, um frenesi de seres bizarros, uma multidão que se desloca em todas as direções.  Ele também se desloca, pois sabe que é só mais um entre os estranhos.

O barulho estridente de uma sirene, vindo talvez no encalço de alguém, o faz, instintivamente, acelerar o passo, esquivando-se entre os transeuntes, sem que, em momento algum, esbarre em alguém.

Agora parece estar em fuga e nem sabe por quê. Seu corpo, leve como uma pluma, foi impelido para frente só com o impulso do medo. Mas, medo de quê? Seria preciso parar e refletir sobre esse gesto instintivo, próprio de um animal selvagem fora do habitat. Procura no corpo algum dispositivo que possa ter sido acionado automaticamente, apenas com a alteração dos batimentos cardíacos, mas nada encontra. Talvez um chip implantado no cérebro seja o responsável por esse gesto brusco, instintivo, mas como ter certeza agora? Há tantas possibilidades. O dispositivo que o impeliu a fugir pode estar coberto por camadas e camadas de acontecimentos e seria humanamente impossível chegar até ele.  Pode ser algo de muito errado que ele tenha feito e, para se autopreservar, tenha esquecido numa das muitas dobras do tempo.  Algo que tenha a ver, inclusive, com a menina de penugem dourada.   

Absurdo continuar fugindo assim, quando o perseguido pode ser um mutante ou um humano qualquer, um desses delinqüentes que aparecem em todas as épocas.

Freada brusca de dois carros na esquina, imprecações, fúria de buzinas. Um dos carros acelera, canta pneu e sai alucinado. De repente, um misto de loucura e sonho envolve este princípio de noite. Seria preciso se refugiar em algum lugar para escapar deste pandemônio? 

Gira sobre si mesmo tentando encontrar uma saída e só então percebe que está em outra rua, em outro tempo, que dobrou uma esquina, atravessou para outra calçada e segue rumo ao sul, —  como se, indo para o  sul, fosse encontrar um lugar seguro.

        (Continua...)

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