quinta-feira, 22 de novembro de 2012

A realidade que não queremos


Por Geraldo Lima

A realidade brasileira está cada vez mais assustadora porque a violência parece não ter fim entre nós. O mais assustador ainda é que a capacidade de alguns indivíduos explicitarem sua brutalidade de forma gratuita  tem sido a marca dessa realidade sangrenta e estúpida. E para quem vive na paz, avesso a essas demonstrações de animalidade, o medo é ainda maior, porque os atos de selvageria explodem assim, por coisa banal, numa situação que poderia muito bem ser resolvida sem a presença da força ou da ignorância.

Nem vou falar do que anda acontecendo em São Paulo, onde policiais e civis estão sendo, sistematicamente, assassinados por bandidos. Fico daqui apreensivo e tomado de medo porque meu filho está lá, estudando, e toda essa carnificina parece fora de controle. É a mais cabal demonstração de falência do Estado. A mais nítida prova da incapacidade de gestão dos que se engalfinham de quatro em quatro anos para conquistar o Poder. A justiça brasileira  parece sumir em meio a essa decadência social. Sem exageros, talvez possamos afirmar que  ela é parte importante das causas dessa decadência que aprisiona o cidadão nas redomas do medo e do estresse. Quantos marginais, que deveriam estar atrás das grades, estão soltos por aí, andando livremente pelas ruas? Parece haver um quê de maldade em tudo isso; não é possível que as autoridades não se comovam com essa situação, que não entrem num estado de frenesi e ânsia em busca de uma saída urgente e duradoura para esse caos.

Mas, deixem-me falar sobre dois fatos que ocorreram recentemente aqui, na Capital do país, e que me deixaram ainda mais pessimista quanto ao nosso destino. O primeiro trata-se do espancamento de um jovem por outros jovens ao sair de uma festa no Plano Piloto. O resultado dessa selvageria é que o rapaz foi hospitalizado com ferimentos graves no corpo. O segundo aconteceu nas proximidades de Sobradinho, uma das cidades satélites de Brasília. Após um desentendimento no trânsito, o ocupante de um dos carros sacou um revólver e desferiu alguns disparos na direção do outro veículo, ferindo dois dos seus ocupantes. O absurdo de tudo isso é que, a princípio, nada parecia justificar essa ação brutal do sujeito que fez os disparos. Em outras palavras, um gesto da mais estúpida natureza.

Todos esses são atos de selvageria que fazem parte de um histórico de outros tantos da mesma natureza e que têm maculado a imagem de Brasília. A cena do espancamento  é quase sempre a mesma: jovens de classe média, mais músculos que cérebro,  geralmente moradores do Plano Piloto, em bando (notem aí a proximidade com as feras), agridem outro jovem até aniquilá-lo. A fúria e a covardia são, nesses casos, elementos fora de controle, já que esses indivíduos, apartados do espírito de civilização, agem fora dos limites da razão. O espantoso, nesse caso de agora, é que um dos agressores é estudante de engenharia na UnB.

Fosse um sociólogo, eu diria que está clara a falência desse modelo de sociedade que se erigiu por aqui. Fosse um indivíduo religioso, diria que falta Deus na vida desses jovens. O fato é que talvez falte família, civilidade, educação e cultura que refinem o espírito, que se contraponham à massificação que embrutece e atrofia o cérebro. O que posso dizer é que, como ser pensante, cidadão e pai, estou cada vez mais pessimista e apavorado com toda essa selvageria e a inoperância do Estado brasileiro.  

(Texto publicado, originalmente, no Jornal Opção. )

4 comentários:

  1. O pior são os atos políticos, amigo. Eles confirmam esta banalização quando o Estado não pede a ajuda da União unicamente por questões partidárias, ignorando o sangue que é derramado enquanto isso. Triste e lamentável. Texto muito lúcido.

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    1. Marcos, o mais lamentável é de fato isto: as questões partidárias se sobrepondo às necessidades e urgências da população. Não quero perder as esperanças, mas não vejo saída para esse estado de coisas. Não a curto prazo. Talvez, com o tempo, consigamos minar o poder "dessa gente ruim", como diria Alceu Valença numa das suas músicas.

      Um abraço, amigo.

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  2. Cara, segundo Bakunin o que chamamos de civilidade, utiliza algumas leis em seus códigos, as quais eram usadas por tribos tidas como primitivas, porém agora com o carimbo do civilizado.
    Pela onda de violência que assola o nosso país, parece que estamos abrindo mão de vez das convenções sociais que nos tornavam seres humanos. Para você que é um homem da palavra, deve ser nítido que nas situações cotidianas, a palavra parece não ter mais o mínimo sentido, não conseguimos mais nos comunicar.
    Talvez Dylan esteja certo: "It´s not dark yet/But we´re getting there"
    Fernando Rocha

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  3. Concordo com você, Fernando: o espírito de barbárie é que domina agora. As convenções sociais, aquelas que deveriam nos propiciar segurança e uma certa felicidade, foram para a lata de lixo. Vivemos quase que em estado natural, como se o projeto de um Estado de Direito, urdido séculos a fio, tivesse fracassado.

    Um abraço, meu caro!

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