terça-feira, 31 de agosto de 2010

A POESIA DE SALOMÃO SOUSA




Nascido em Silvânia, GO, em 1952, Salomão Sousa reside em Brasília desde 1971, onde exerce a profissão de jornalista. Já publicou vários livros de poesia, entre eles A moenda dos dias/O susto de viver (Ed. Civilização Brasileira, 1980); Criação de lodo, 1993, DF; Estoque de relâmpagos (Prêmio Bolsa Brasília de Produção Literária, 2002, DF); Ruínas ao Sol (Prêmio Goyaz de Poesia, Editora 7 Letras, 2006) etc.
A poesia de Salomão Sousa, no livro Ruínas ao Sol, que apresento aqui, é marcada pelo rigor formal e pelo lirismo intenso. Desse modo, a carga racional que o poeta despende na elaboração dos poemas não esvazia a tensão do discurso que expõe as fraturas do ser. Ao contrário, amplia-a. Embora a presença da morte e de outros elementos negativos seja constante nesses poemas, o eu lírico não cessa de apontar para um futuro de vitórias: “as carnes prontas para a paz e a vitória/Para trás as esterqueiras da incerteza/e as ameaças das quadras da secura” (pág. 14).  Como bem assinalou o poeta Ronaldo Costa Fernandes, “... Ruínas ao sol é um livro em que a visão otimista se sobrepõe à visão derrotista”.
Outro elemento a se destacar nesses poemas de Ruínas ao Sol é a presença de imagens que nos remetem ao ambiente rural, interiorano, criando um clima de bucolismo.  Mas não há nisso traço algum de provincianismo ou conservadorismo. A poesia de Salomão Sousa mescla o tom elevado, de extremo refinamento estético, com elementos prosaicos, cotidianos, como em “Não morram os gomos/no desalinho do chavascal/Venha o casco de uma mula/a boca de uma lebre” (pág. 47).  E é nisso que está contida a sua modernidade.

DOIS COMENTÁRIOS:

 1º Sobre Ruínas ao Sol:
“Livro de difícil deciframento, volume denso, não chega, contudo, a ser um livro hermético como um Invenção de Orfeu. Exige, entretanto, leitura e releitura. E é na releitura dos poemas que se descobre tema, conteúdo e a formulação intrigante com a qual o poeta trama sua poética.” (A força da poesia de Salomão Sousa, por Ronaldo Costa Fernandes)
  
2º Sobre a poesia de Salomão Sousa:
“A análise da poesia de Salomão Sousa nos permite situá-lo não só no contexto brasiliense, mas nacional. Seu nome vem se firmando sem dificuldades, porque é signatário de uma poesia inovadora, sem as camisas de força estilísticas, arejada, original, portanto moderna. Moderna, sim, porque mantendo empatia com a contemporaneidade, e em meio ao cipoal das (in)tensas relações desse mundo de rápidas transformações, com seus escalonamentos de códigos, totens e valores, consegue  dar o pulo e amadurecer cada vez mais.” (A poética da consciência e do combate, por Ronaldo Cagiano)

TRÊS POEMAS DE ‘RUÍNAS AO SOL’:

Conhecemos dias de ira, de fogueira
de goiva nos músculos, de cão destravado
Mas sobra o vento novo sobre as orlas
Em Thule sobra o transe dos guerreiros
Sobram limões, palavras renovadas
Vêm galhos ornar lábios e janelas
Vão vê-los só quem busca por beleza
só quem pensa colheita, quem deseja
quem pensa fruto e desfrutar desejos
Vamos falar daqueles cogumelos
cresciam rente ao rego e às formigas
Já chegam outros oferecendo sol
Com seus lábios abertos e janelas

Muito existe, menos o país da ferrugem
      
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A Lua vigia a viagem
do mercador de lã
Há lamas nos caminhos
Tílias bravas dentro do inverno

Desarreia as mulas
que patearam a lua
no espelho das poças
E limpa os broches das arreatas

Depois de guardar as botas
o filho mostra o desenho:
a lua que vela
um mercador de lã

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Vamos fazer uma tempestade
com dia e hora marcados
uma dessas tempestades violentas
onde os corpos voam
seja andorinha ou ponte
se chocam se quebram
pés sobre as faces
mãos enfiadas nas nádegas
ou uma dessas tempestades lentas
onde não interessam as horas
os estandartes de Rilke
as águas em plenas invasões
nada que impeça o ar
de ir solto pelo mundo afora
os corpos arrastados sem cabeça
  

Um comentário:

  1. Muito obrigado!
    são raras as gentilezas
    dos rodapés
    em tempos de virtualidade!

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